Para Edna e Fátima - Sobre a formação no Soho

Olá Edna e Fátima. Me formei no Soho no 2000, depois de 3 anos de curso. Vou lhes passar com sinceridade minha visão como ex-soháqueo, os prós e os contras. Soho é certamente uma das melhores academias do país, ensinam etiqueta, lavar cabelos com a técnica japonesa, massagem express, puxar reflexo em touca descartável, enrolar permanente como um jedi, escova lisa, escova denman (minha maior dificuldade no curso, exigem muita técnica), coloração, relaxamento, 3 linhas de corte principais de onde criam-se variações do tema (linhas da escola Vidal Sasson). Soho é bom pra quem ainda tem pouco ou nenhum conhecimento sobre cabelo. Impossível se formar quando não se está interessado ou pouco interessado em ser cabeleireiro, a instituição pressiona e avalia constantemente todos seus funcionários. O "biotipo" do profissional que vai continuar quando formado é daquele que aparece nas reuniões, não atrasa, não falta, participa dos campeonatos, das faxinas. Atrasos e faltas são pecados graves, punidos com castigos como impedir o aluno de fazer prova teórica ou prática, o que significa mais um mês de aula (as aulas são pagas, na minha época custavam R$ 100,00 por mês descontados da minha folha de pagamento. Como era um bom assistente e engolia os sapos que me obrigavam, não faltava nem chegava atrasado, o cabeleireiro pagava metade da minha aula). Cada estágio tem um número de modelos a serem realizadas na Academia sob supervisão dos monitores (quando me formei, fui monitor dos SAS - Liberdade), além de aulas de movimento dos instrumentos de trabalho (escova, secador, bobbies, tesoura, denman) que são avaliadas. Após concluir tudo isso, o aluno pode fazer a prova teórica (anatomia dos cabelos e perguntas técnicas sobre o estágio do aluno); após aprovado, pode fazer a prova prática numa modelo real, que será avaliada por 5 monitores. Anulam a melhor e a pior nota, deixando três notas para a média. Exige-se no mínimo 70% de qualidade tanto na teoria quanto na prática, ou seja, só passa de estágio quem está realmente pronto. O lado ruim é que tem muita reunião pra pouco assunto, exigem sua presença em todas (tem ficha de presença), trabalha-se de 10 a 12 horas diárias, não dão carteira assinada (os alunos são sócios industriais da empresa, mas só no nome, porque pra mim, sócio pode pelo menos usar o telefone). O dono (sr Iijima san) é presidente no Brasil da ONG Zeladoria do Planeta, e se vc quiser continuar na empresa depois de formado, deve dar as caras em eventos cansativos como limpar o Parque do Ibirapuera, a Av. Paulista, a Liberdade, o Parque da Aclimação, a Praça da Berrini. Fui em todos eles, aprendí a dar valor no trabalho dos lixeiros, não jogo um papel na rua. É um trabalho de conscientização, mas fala sério, em pleno domingão de sol acordar 6 horas da manhã pra chegar no horário da saída e ficar varrendo por horas e horas... niguém merece!!! No dia a dia do salão, é comum ouvir que os japoneses são protegidos da empresa. Nas provas, no entanto, os japoneses realmente vão melhor que os brasileiros, pois são mais técnicos e dedicados (eu como monitor ví isso claramente). Acho que apenas 30 ou 40% de quem entra como assistente consegue se formar e destes, poucos são contratados. Agora, o diploma do Soho é muito forte e bem-vindo em qualquer salão de beleza. Sei disso porque já trabalhei em vários, houve lugares em que perguntei se precisavam de cabeleireiro e disseram que o quadro de funcionários já estava cheio. Então me perguntou onde eu trabalhei, respondí no Soho, "no Soho? Ah, se vc trabalhou no Soho vc vai trabalhar aqui do meu lado". Agora, entre os soháqueos, havia uma visão de que o Soho era tudo, que era o fim da linha, a fronteira final dos cabeleireiros. Saí de lá pra ver de perto isto. Não é bem assim. Travei conhecimento com alguns grandes profissionais Brasil afora e ví que em alguns pontos, meu trabalho era bom, mas em outros eles se sobressaíam. É o caso da escova, que é bem básica no curso e no dia a dia do salão. Um dia recebí aulas de um profissional do Lofficial. Os detalhes da escova dele me deixaram perplexos. Muitas coisas diferentes e interessantes. O resultado dava de 10 na minha escova. E é o caso do acabamento dos cabelos. No Soho, quem faz o acabamento é o assistente e não o profissional. Na correria do lugar é comum o profissional sequer alinhar o contorno com a tesoura, deixando tudo para o assistente. Observei o José Carlos Celidonios de Jundiaí fazer o acabamento. Também dá de 10 no meu acabamento. Ele primeiro faz o acabamento, depois ele corta em cima do acabamento. E finaliza o acabamento na navalha, que é sempre trocada. Nunca ví um acabamento como este (ele tem 44 anos de profissão, a maior parte cortando masculinos). Enfim, ensina-se muita coisa, mas perde-se muita coisa, até porque Soho é padronizado, nenhuma técnica que não seja ministrada na Academia deles pode ser utilizada nos salões pelos profissionais, mesmo que seja melhor. É um clube do bolinha. Humildade, paciência, perseverança são qualidades fundamentais pra chegar até o fim. E mesmo assim, eu recomendo. Vale a pena. 

Um abraço.